Brasília – A confirmação de que as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) estão participando das “conversas exploratórias” com o governo colombiano e críticas a diversos países, inclusive ao Brasil, por terem ajudado o Exército em ações contra a guerrilha, deram o tom do chamado “Vídeo pela paz”, divulgado ontem pelo grupo rebelde. Na mesma mensagem, o líder da organização, Rodrigo Londoño Echeverry – conhecido como Timoleón Jiménez ou Timochenko – confirmou que se senta à mesa de diálogo “sem rancores nem arrogância”, embora tenha usado os termos “pedante” e “burguês” ao citar o presidente colombiano, Juan Manuel Santos.
Um trecho da letra é dedicado a ataques aos Estados Unidos e ao Brasil pelo apoio ao Estado colombiano. O ataque ao governo brasileiro se deve à venda de caças Super Tucanos da Embraer para Bogotá, aeronaves usadas pelo Exército nas missões de combate ao grupo. Procurado pela reportagem, o Ministério da Defesa brasileiro afirmou que não comentaria o assunto. No mesmo dia da publicação do material no site das Farc, sete guerrilheiros morreram e cinco foram capturados durante uma operação militar em Puerto Concordia, no centro do país. Além disso, Santos declarou que pretende acabar com os confrontos por meio do diálogo.
O vídeo com Timochenko é a primeira declaração da guerrilha desde que Santos anunciou, em 27 de agosto, as negociações em busca do fim do conflito de quase meio século. “Juramos vencer e venceremos”, bradou, depois da exibição do rap cantado por jovens guerrilheiros. No clipe, os membros das Farc vestem camisetas com a estampa do comandante da Revolução Cubana Che Guevara, usam uma braçadeira com a bandeira da Colômbia e cantam sobre o processo de diálogo com Bogotá. “Vou para Havana, desta vez para conversar com o burguês que nos procurava, não pôde nos derrotar. Vou para Havana, desta vez para conversar com aquele que me acusava de mentir sobre a paz. Vou para Havana, saibam com que emoção vou conversar sobre a sorte da minha nação”, afirma letra, em referência às discussões que serão feitas em Cuba.
Gilberto Rodrigues, professor de relações internacionais da Faculdade Santa Marcelina, em São Paulo, considera que o vídeo foi uma tentativa de as Farc se humanizarem ante a opinião pública. “Durante muitos anos, o governo tratou de demonizar a guerrilha e alguns atos cometidos pelo grupo realmente podem ser considerados terroristas”, ponderou. “Mas esse vídeo com os guerrilheiros cantando um rap, estilo musical muito popular, é uma tentativa de mostrar que entre os integrantes das Farc há jovens e pessoas comuns dispostas a negociar”, refletiu o especialista brasileiro, acrescentando que a escolha da vestimenta dos cantores parece ter sido algo estudado, pois Che Guevara continua uma referência para os movimentos de esquerda na América Latina. Ele lembrou que um dos pontos do acordo entre a organização e o governo, que deve começar a ser discutido em Oslo (Noruega), passa pela participação dos guerrilheiros na política.
Pouco antes da divulgação do vídeo das Farc, o presidente da Colômbia afirmou, em seu programa de rádio, En línea con el Presidente, que pretendia negociar por meio do diálogo, sem “repetir os erros do passado” — em referência à política de seu antecessor, Álvaro Uribe. “Com muita esperança, nós, o povo colombiano, veremos se podemos encerrar este conflito, que nos causou tanta dor”, estimou. O diretor da Polícia Nacional, general José Roberto León Riaño, por sua vez, ressaltou que a corporação não baixará a guarda frente aos grupos armados.
O especialista em América Latina Ralph Espach, do instituto norte-americano de análises CAN, explicou que a intenção do governo de acabar com as hostilidades seria um triunfo para Santos, que levaria o país à estabilidade. “A questão é se as Farc estão realmente interessadas em negociar ou se essa é apenas uma tática para assegurar um temporário cessar-fogo ou atrair apoio internacional”, salientou, em aparente ceticismo a um acordo.
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